Documento mostra que Bolsonaro recebeu segundo pacote de joias
- Blog do Yan Ney
- 8 de mar. de 2023
- 4 min de leitura
Um mês antes de sair do Brasil, o então presidente visualizou a caixa contendo objetos da marca Chopard em seu gabinete.

O ex-presidente Jair Bolsonaro recebeu pessoalmente o segundo pacote de joias trazido ilegalmente pela comitiva do Ministério de Minas e Energia em novembro de 2022. Segundo um recibo oficial, o destino dos objetos seria o gabinete presidencial.
O documento foi divulgado pelo jornal "O Estado de S. Paulo" e confirma que o mandatário visualizou a caixa com itens da marca Chopard. Nela continha um masbaha (um tipo terço), um relógio, um par de abotoaduras, uma caneta e um anel. Não se sabe o paradeiro dos objetos ou qual é o valor total estimado, mas só o relógio está avaliado em R$ 223 mil.


A defesa de Bolsonaro alegou que os bens recebidos são de caráter pessoal e que não existem irregularidades no episódio. O advogado do ex-presidente, Frederick Wassef, também alegou que “certas informações” foram tiradas de contexto.
Um outro documento mostra que o assessor do ex-ministro de Minas e Energia, Antonio Carlos Ramos de Barros Mello, entregou esse pacote ao Gabinete Adjunto de Documentação Histórica para ser incorporado ao acervo da Presidência da República. O recibo foi datado no mesmo dia em que Bolsonaro teria recebido a caixa em seu gabinete.

Trazidos ilegalmente pela comitiva
Os dois pacotes direcionados à Presidência da República foram dados pelo príncipe Mohammed bin Salman Al Saud, do governo da Arábia Saudita, no final de um evento em outubro de 2021. Bolsonaro teria sido convidado a comparecer à ocasião, mas como não pode ir, o ex-ministro de Minas e Energia Bento Albuquerque representou o Brasil.
O saudita entregou dois pacotes ao ex-ministro. O primeiro continha um relógio, um anel, um colar e um par de brincos de diamantes com valor total de 3 milhões de euros, o equivalente a R$ 16,5 milhões. Os itens seriam um presente para a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro e ao ex-presidente Jair Bolsonaro. Em suas redes-sociais, Michelle foi irônica ao revelar que não sabia de joia alguma.

Chegando ao Aeroporto de Guarulhos no dia 26 de Outubro, um dos assessores não conseguiu ultrapassar a alfândega da Receita Federal. Ele teria sinalizado que não tinha "nada a declarar", mas estava carregando as joias na mochila.
Segundo a Receita Federal, qualquer bem cujo valor passa de mil dólares precisa ser declarado junto com o pagamento de uma taxa de 50% da quantia, que nesse caso seria R$ 8,25 milhões.
O governo Bolsonaro tentou pelo menos 8 vezes recuperar o pacote, mobilizando a chefia da Receita Federal, o Itamaraty e o Ministério de Minas e Energia. Como a taxa não foi paga em nenhuma das vezes, o órgão não devolveu as joias.
Enquanto isso, a segunda caixa conseguiu passar pela alfândega e chegou à Presidência da República, mas não foi declarada. A Polícia Federal já abriu um inquérito para investigar o caso.
De acordo com a legislação brasileira, presentes recebidos em cerimônias com chefes de Estado pertencem ao País, e não ao acervo pessoal do mandatário.
As regras dizem que os itens pessoais de um presidente são de natureza perecível e personalíssima, como roupas e bebidas. Além disso, objetos de cunho documental, tal qual arquivos, também fazem parte do acervo pessoal.
A Receita Federal lançou uma nota para esclarecer o episódio:
“Acerca das notícias veiculadas inicialmente no jornal O Estado de São Paulo sobre a apreensão de joias no Aeroporto Internacional de Guarulhos, no dia 26/10/2021, a Receita Federal esclarece o seguinte, preservando dados protegidos por sigilo:
Todo cidadão brasileiro sujeita-se às mesmas leis e normas aduaneiras, independentemente de ocupar cargo ou função pública.
Os agentes da Receita Federal atuantes na aduana são servidores de Estado, com prerrogativas e garantias constitucionais que lhes garante isenção e autonomia no exercício de suas atribuições legais.
Todo viajante que traga ao país bens pertencentes a terceiros deve declará-los na chegada, independentemente de valor.
No caso de bens pertencentes ao próprio portador, devem ser declarados aqueles em valor acima de US$ 1 mil, limite atualmente vigente.
Caso não haja declaração de bem, é exigido 50% do valor a título de tributo, acrescido de multa de 50%, reduzida pela metade no caso de pagamento em 30 dias.
Na hipótese de agente público que deixe de declarar o bem como pertencente ao Estado Brasileiro, é possível a regularização da situação, mediante comprovação da propriedade pública, e regularização da situação aduaneira. Isso não aconteceu no caso em análise, mesmo após orientações e esclarecimentos prestados pela Receita Federal a órgãos do governo.
Não havendo essa regularização, o bem é tratado como pertencente ao portador e, não havendo pagamento do tributo e multa, é aplicada a pena de perdimento, cabendo recursos cujo prazo, no caso, encerrou-se em julho de 2022.
Após o perdimento, é possível, em tese, o bem ser levado a leilão, sendo que 40% do recurso arrecadado é destinado à seguridade social e o resto ao tesouro. É possível também, em tese, a doação, incorporação ao patrimônio público ou destruição.
A incorporação ao patrimônio da União exige pedido de autoridade competente, com justificativa da necessidade e adequação da medida, como por exemplo a destinação de joias de valor cultural e histórico relevante a ser destinadas a museu. Isso não aconteceu neste caso. Não cabe incorporação de bem por interesse pessoal de quem quer que seja, apenas em caso de efetivo interesse público.
Os fatos foram informados ao Ministério Público Federal, sendo que a Receita Federal colocou-se à disposição para prosseguir nas investigações, sem prejuízo da colaboração com a Polícia Federal, já anunciada pelo Ministro da Justiça.
Finalmente, a Receita Federal saúda os agentes da aduana que cumpriram seus deveres legais com altivez, cortesia, profissionalismo e impessoalidade, honrando a instituição a que pertencem.”
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