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Sportswashing: uso do futebol para melhorar imagem saudita

  • Foto do escritor: Blog do Yan Ney
    Blog do Yan Ney
  • 17 de ago. de 2023
  • 3 min de leitura

Nos últimos meses, Arábia tem atraído grandes nomes do esporte com salários milionários


Neymar e presidente do Ah-Hilal durante a assinatura do contrato | Reprodução

Neymar foi anunciado oficialmente como jogador do Al-Hilal, da Arábia Saudita, na terça-feira (15), com contrato avaliado em 320 milhões de euros (R$ 1,7 bilhão). O atacante se junta aos craques Cristiano Ronaldo, Kanté, Mahrez, Benzema, e muitos outros cuja lista passa de 20 contratações que já custam 1,5 bilhão de euros (R$ 8 bilhões de reais) ao Estado Saudita.


O interesse pela pauta esportiva é uma forma de limpar a imagem do país, hoje autoritário e ditatorial. Em junho, a Arábia estatizou seus quatro maiores times (Al-Hilal, Al-Nassr, Al-Ittihad e Al-Ahli) que, desde então, são geridos pelo Public Investment Fund (PIF). O “fundo soberano” recebe aportes de empresários e do governo, beneficiado pelo mercado de petróleo, e investe em fabricantes de videogames, carros elétricos, construção civil, e, claro, futebol. Gestor do PIF, o príncipe saudita Mohammad bin Salman, é aquele que, em 2018, aprovou a captura e assassinato do jornalista saudita Jamal Khashoggi, crítico ao governo.


A tática de sportwashing, utilizada nesse caso, busca usar o esporte para melhorar a imagem pública e desviar o foco de outras questões - de que a Arábia Saudita comete crimes contra liberdades individuais. Professor adjunto de jornalismo da Faculdade de Comunicação da Uerj, Filipe Mostaro explica o interesse pela pauta esportiva.


“O projeto tenta mascarar tudo o que acontece nesse país através de uma liga de futebol, que com muito dinheiro vai tentar comprar vários craques e tornar quatro times em reais potências do Oriente Médio. A força que o esporte tem para mobilizar as pessoas é algo que políticos e regimes ditatoriais usam para colocar a sua ideologia como algo positivo, como algo a ser seguido por um grande número de pessoas”, observa.

O sportwashing não é restrito ao futebol saudita, tampouco à quantidade de estrelas que jogam no seu país. O Brasil, na Copa de 70, aproveitou o tricampeonato para melhorar a reputação do regime militar que comandava o país há quase uma década. A Alemanha Nazista usou o esporte para se autopromover, assim como EUA e Rússia nas olímpiadas durante a Guerra Fria. Em 1978, enquanto a Argentina vivia sua ditadura, recebeu uma Copa do Mundo (sempre ela). A menos de 1km do palco da final, onde os hermanos saíram vencedores, a Escola Superior de Mecânica da Armada era o principal centro de tortura do país, por onde passou 5 mil opositores políticos e a maioria não saiu vivo.


Presidente da FIFA, Gianni Infantino, e presidente da Rússia, Vladimir Putin, antes da abertura da Copa do Mundo 2018 | Reprodução

O professor colaborador do Instituto de Relações Internacionais e Defesa da UFRJ, Eduardo Russo, destaca que usar o esporte para desviar o olhar, principalmente da mídia, pode ser perigoso. Ele conta que a Rússia, na Copa do Mundo em 2018, tentou tirar o foco de seu interesse na região da Crimeia, mas só reacendeu esse debate e levantou outros, como o cerceamento de liberdades da comunidade LGBT.


“Utilizar megaeventos esportivos para se autopromover é uma faca de 2 gumes. Se você conseguir usar isso de boa forma, ótimo. Veja (as olímpiadas de) Barcelona em 1992. O que era a cidade antes disso? Mudou pra melhor. Agora, o Rio de Janeiro, em 2016, teve um impacto negativo porque escancarou problemas de segurança pública, por exemplo. É perigoso um país usar o esporte para se promover”, expõe.

Eduardo Russo explica que a Arábia Saudita também utiliza o esporte para diversificar as matrizes econômicas por meio do turismo. Para o professor, quando se percebe que o petróleo não vai durar para sempre, é preciso um outro investimento de médio e longo prazo. O turismo de alto luxo, que está começando a ser impregnado no país, se apoia na tática dos Emirados Árabes Unidos, que transformou Dubai e Abu Dhabi em lugares importantes no Oriente, a ponto da Fórmula 1 promover uma de suas etapas na região.


A preocupação em torno desse assunto é muito clara. Os atletas vão jogar pelo país ou por um regime? Dinheiro vindo do petróleo não é problema para os sauditas, então quanto mais jogadores “garotos-propaganda”, melhor. Os sheiks continuam investindo em times europeus, como Chelsea, City e Newcastle, mas enquanto colocar aportes no futebol local resulta na melhora da própria imagem, assim será. Mas, com cautela, retorno com Eduardo Russo: “É perigoso um país usar o esporte para se promover”.


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